Antonio Elias, o rei do milho

Antonio Elias, o rei do milho

Por Carmen Teresa Costa*

Antônio Elias da Costa nasceu em 20 de julho de 1859, dia de São Elias, na centenária Fazenda da Cachoeirinha, município de  Sabará. Era o terceiro filho do Major Joaquim Antônio da Costa Araújo e de Rita Cândida da Costa. Muito jovem tomou a decisão de deixar a fazenda dos pais e foi fazer sua própria história. Morou algum tempo em Confins e, tendo se casado em 1893 com Rita Vianna Costa, foi viver em Dr Lund, distrito de Pedro Leopoldo, na Fazenda Santo Antônio da Busca Vida.

A sede da fazenda ainda hoje abriga seus descendentes e sua construção revela diferentes técnicas utilizadas.  No começo, era uma casa pequena simples de taipa, que foi ampliada com a utilização de adobe e posteriormente acrescida de novos espaços feitos com tijolos e cal. A construção da casa conta uma parte de sua trajetória; foi se modificando para adequar-se ao tamanho da família de 13 filhos e suas possibilidades financeiras.

Antônio Elias foi um dos maiores proprietários de terra na região que abrangia Pedro Leopoldo, Prudente de Moraes, Capim Branco e Vespasiano. Como produtor rural, tornou-se conhecido com o “Rei do milho” e foi fornecedor de madeiras e tropas de burros para o trabalho na Mina de Morro Velho, em Nova Lima.

Em sua fazenda, produzia a manteiga da marca Narceja, que era comercializada em Belo Horizonte e Rio de Janeiro, sendo premiada em 1927 e 1929 no Estado de Minas Gerais e nacionalmente na capital federal Rio de Janeiro.

Foi o idealizador, benfeitor e administrador da construção da Capela de São João Batista, em Dr. Lund, inaugurada em 1909. Os registros desta obra mostram um trabalho cuidadoso com o envolvimento de toda a comunidade, liderada por ele.

Por sua iniciativa, requereu ao poder público, construiu e manteve na sua propriedade a primeira escola rural do distrito, onde estudaram seus filhos e as crianças da comunidade. Mais tarde a escola foi transferida ao Estado que a transformou em escola pública de ensino fundamental.

Ainda em outra iniciativa, ele, a esposa Rita e os seus sogros, proprietários da Fazenda Busca Vida, fizeram a doação de um terreno para a construção da estação ferroviária e da pequena Vila Dr. Lund. Consolidou-se, assim, o início do desenvolvimento da nova comunidade, atraída pela Igreja, escola, acesso ao transporte de passageiros e cargas.

Estavam dadas as condições para o escoamento da produção da sua e das demais fazendas da região e o desenvolvimento do novo vilarejo. A estação foi inaugurada em 15 de fevereiro de 1895 e esta passou a ser a data da fundação de Dr Lund, que se chamava até então Horta Velha.

Além de produtor rural e criador, ele foi comerciante: tinha um comércio na Rua Dr Herbster com a principal. Foi industrial e capitalista. Antônio Elias diversificou suas atividades para o crescente ramo da indústria têxtil, tornando-se acionista das Companhias Cedro e Cachoeira, Industrial de Belo Horizonte e da Cachoeira Grande em Pedro Leopoldo, onde desempenhou o papel de Conselheiro, durante vários anos.

Esta trajetória de vida profissional está registrada em diferentes documentos cartoriais, nos quais ele é identificado como lavrador, tropeiro, fazendeiro, produtor, criador, industrial e capitalista. Homem de muitos amigos e parceiros de trabalho, era generoso e acolhedor, sendo constantemente procurado em sua casa para algum apoio ou conselho. Se a pessoa se sentisse constrangida de entrar, dizendo estar com pés sujos, ele as recebia dizendo: “vamos entrar, casa que não entra gente, não suja e não entra Deus.”

Após o falecimento de Antônio Elias, ocorrido precocemente em 31 de março de 1922, em decorrência de complicações geradas por diabetes, a viúva Rita Viana da Costa, com apenas 45 anos, e seus 13 filhos mantiveram a tradição familiar empreendedora que incluía também projetos de benefícios públicos.

Construíram em 1931 uma usina hidroelétrica para gerar energia, que era distribuída aos moradores de Dr. Lund. Ela também abastecia a Usina Santa Rita, de pasteurização de leite e fabricação de queijos especiais, que tinha em seus quadros um técnico vindo da Dinamarca.

O mercado de Belo Horizonte passou a ser abastecido com queijos, o Leite Lund e a Manteiga Narceja. A pasteurização de leite era um processo recente no país, em Minas Gerais existiam apenas dois que passavam pelo processo, o Leite Lund e outro em São João Del Rey.

A Organização Pan-Americana da Saúde publicou uma análise do leite, enaltecendo sua excelente qualidade, seu teor de 4,25% de gordura e com uma contagem de bactérias perfeitamente aceitável mesmo nos padrões do Estados Unidos e raramente alcançado no Brasil.

Antônio Elias deixou uma grande família, formada por sete homens e seis mulheres, que lhes legaram uma enorme descendência. São seus filhos Marieta Costa Caldas, Madalena Costa e Silva, Joaquim Antônio da Costa, Antonieta Costa, Antônio Elias da Costa Filho, Elisa Costa Alves, Lafaiete Costa, João Batista da Costa, José Elias da Costa, Levi Costa, Helena Costa Monteiro, Octávio Costa e Lígia Costa Simões.

A viúva de Antonio Elias, Rita Viana (no alpendre, à esquerda do filho Toniquinho, de camisa branca), e sua grande família

Em tempos mais recentes, parte das suas propriedades foi transformada pelo seu filho José Elias da Costa (Sô Zeca) nos bairros São José, Santa Rita, Santo Antônio e toda a Várzea Antônio Elias, em Pedro Leopoldo, local onde, a exemplo do seu pai, doou o terreno e ajudou a erguer a Igreja de São Sebastião, de quem era devoto.

Nós, netos e bisnetos, não o conhecemos e foi pesquisando a história familiar de nossos antepassados, os Costas, que tomamos conhecimento de sua vida. Hoje, temos elementos que nos permitem identificar o Antônio Elias da Costa como um homem moderno, contemporâneo, à frente de seu tempo.

Adolescente ainda, saiu do conforto de casa, de uma vida programada e lançou-se ao mundo seguindo a bússola de sua alma, levando nos alforjes os valores que o nortearam: trabalho, organização, coragem, ousadia, tino comercial, amizade, humor, solidariedade, responsabilidade e amorosidade com sua família e a comunidade.

Em sua trajetória, abriu e transitou por trilhas, estadas, ferrovias, foi na frente e com seu caminhar trouxe para si e para seu sistema familiar a possibilidade de escolher novas perspectivas e formas de produzir a vida além daquelas experimentadas por várias gerações de seus ancestrais, que vieram e viveram em um mundo rural mineiro desde 1720.

Depois de identificar e conhecermos parte de sua história através dos rastros de sua passagem, documentos e fatos, achamos que a melhor resposta à pergunta de quem ele foi possa ser dada pela imagem fantástica de um conto do escritor uruguaio Eduardo Galeano. No conto, um homem conseguiu subir aos céus e, quando voltou, contou como é a vida humana vista lá de cima.

“— O mundo é isso — revelou — Um montão de gente, um mar de fogueirinhas.

Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.”   (Livro dos Abraços, 1991)

Que você nosso avô, receba nosso reconhecimento, admiração, amor e gratidão por ter irradiado sua luz e incendiado de sonhos e realizações a vida de muitos.

Texto extraído da pesquisa e escritos para o livro: Nós, os Costas. Histórias de Ancestralidade, Vivências Afetivas, Famílias e Fazendas. Por Carmen Teresa Costa e Luís Antônio da Costa

*Carmen Teresa Costa é a sétima filha de João e Eni Costa, mãe do Lucas, Bernardo e Adriana. Professora universitária aposentada, pesquisadora e terapeuta ocupacional.

Redação

ARTIGOS RELACIONADOS

José de Paula, pioneiro da genética animal no Brasil

José de Paula, pioneiro da genética animal no Brasil

José de Paula foi um dos primeiros engenheiros agrônomos negros do país. Criou o Sindicato Rural e idealizou a primeira exposição agropecuária

LEIA MAIS
Clube Social comemora 67 anos com baile especial

Clube Social comemora 67 anos com baile especial

A ideia de criar um clube para Pedro Leopoldo nasceu em 1957, com a iniciativa de um grupo de cidadãos, entre eles Sebastião Lopes Diniz (Tinoco) e Adelso Ney Lopes,

LEIA MAIS