Dra. Maria de Lourdes é médica em destaque de Minas Gerais 2020

Dra. Maria de Lourdes é médica em destaque de Minas Gerais 2020

Aos 71 anos, a médica pediatra Maria de Lourdes da Costa aparenta no mínimo dez anos menos, tal o olhar curioso sobre o mundo, que se combina ao ar sereno para lhe dar a juventude perene das pessoas necessárias.  Aos 9 anos, já mostrava que a Medicina era o seu caminho, quando ajudava a mãe, a fantástica Dona Eni, a fazer curativos nos trabalhadores da Fazenda do Matacão, em Dr. Lund, onde viveu com a imensa família. Cresceu ao lado de mais doze irmãos, filhos de João Costa, de quem ganhou o apelido de “Lulude” e que ainda hoje ouve dos que lhe são próximos. “Neste momento, eu comecei a entender o que é gostar e cuidar do outro. E que gostaria de fazer isso pela vida toda”, conta.

A prática junto à mãe ampliou-se e tornou-se missão nos últimos 47 anos. E lhe valeu, neste mês de outubro, o título de Médica Mineira em Destaque de 2020, conferido pela Associação Médica de Minas Gerais, Conselho Regional de Medicina e Sindicato dos Médicos de MG. O reconhecimento da classe médica vem em decorrência de sua forte atuação na promoção, prevenção e implantação de políticas públicas e consequentes resultados para a população na redução na mortalidade materna, fetal e infantil.

Toda a formação de Maria de Lourdes foi em escola pública, começando em Pedro Leopoldo e seguindo em Belo Horizonte, no Colégio Estadual e na Escola de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Formou-se em 1973 e especializou-se em Pediatria, que complementou com cursos na área de Saúde Pública, Formação de Psiquismo Infantil e Gestão Clínica– são quase cinco décadas de permanente atualização em mais de 300 cursos e simpósios. “Vivemos um mundo doido, de constante transformação e, a toda hora, as coisas mudam”, aponta Lulude.

Em 1975, logo após a residência, ela já trabalhava na Maternidade de Pedro Leopoldo. Guardou em algum lugar os planos de trabalhar na África, na Amazônia, enfim, de amenizar o sofrimento das crianças nos lugares mais difíceis do planeta, de onde vinham as grandes narrativas de fome, doença e dor. Em pouco tempo, Lulude viu que a tragédia se repetia ao seu lado, aqui mesmo, em forma de desnutrição, falta de vacinas e, principalmente, de informação. “Saúde é muito mais educação, não é enfrentar doença, mas evitar com qualidade de vida, acesso a moradia, boa alimentação, saneamento básico, além da alegria, da organização social, da mobilidade”, diz a médica, que nunca diz “eu”, é sempre “a gente”.

Um espírito de equipe que levou Lulude à saúde pública, à secretaria de saúde e às demandas do município. Nos últimos doze anos, ela procurou saber cada vez mais sobre o conceito dos “mil dias”, aquele que diz que a construção da criança se dá no período entre o útero e os dois primeiros anos de vida – ou seja, garantir que ela tenha assistência nesse momento colocaria a criança, mesmo a mais carente, em pé de igualdade com aquelas que nasceram com mais privilégios. ”Claro, desde que ela tenha vínculos afetivos, o leite materno e que seja valorizada como ser humano”, salienta a médica.

De 1990 para cá, vários projetos a tocaram especialmente. Em um primeiro momento, ela queria que as crianças fossem atendidas em instalações adequadas, confortáveis e seguras. Assim, chamou a sociedade civil, empresas, clubes de serviço, para equipar o berçário e financiar capacitação profissional. Sob a influência de Dona Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança e linha de frente na luta pela redução da mortalidade infantil, Lulude se juntou a empresas locais para, numa parceria público-privada, criar a Clínica da Saúde da Mulher e da Criança, com atenção específica para os dois grupos.

Lulude: “a gente nunca está sozinho”.

Ao longo de sua vida, Lulude trabalhou principalmente fora do consultório, nos primeiros cuidados a milhares de bebês nascidos na Maternidade e nos órgãos públicos de saúde, insistindo em ações que levavam em conta a criança e sua família. E o acesso a saneamento básico, alimentação, moradia de qualidade, entre outras condições dignas de vida. Nestes espaços, desenvolveu projetos como o de prevenção aos efeitos da asma, ampliação da cobertura de vacinação ou alojamento conjunto entre mãe e filho – ações simples e eficientes, que evitam internações ao investir na promoção da saúde. Ainda hoje, ela está à frente de projetos com essas características. “O Primeiro banho do pequeno cidadão”, com o Rotary, consiste em ações educativas sobre higiene, amamentação e cuidados, além da oferta de um Kit de higiene e vestuário para famílias necessitadas. Ainda com seus colegas de Rotary, está envolvida em ações como a ampliação do atendimento em creches, tanto com a construção de mais salas como de áreas de lazer.

A Escola de Gestantes é outro desses projetos, simples e efetivos. Lulude explica que a iniciativa apoia as futuras mamães ouvindo, respeitando e valorizando suas histórias de vida, “vida que pode ser transformada com essa percepção de cidadania e investimento no ser humano”. destaca a pediatra. Como todos os outros projetos, é centrado no futuro das nossas crianças e desenvolvido em equipe, em grupos nos quais as pessoas trabalham juntas e partilham ideais e sonhos. “A gente nunca está sozinho, a gente veio para este mundo para ser um cidadão, para viver e servir”, diz Lulude.

Ela já foi cidadão benemérita pela Câmara de Pedro Leopoldo, reconhecida como amiga do município por serviços prestados e de toda a humanidade com a Comenda da Paz Chico Xavier em Uberaba. A homenagem da Associação Médica, do Conselho Regional de Medicina e do Sindicato dos Médicos, mais do que merecida, deixou Lulude “assustada”. Não podia ser diferente: a modéstia fez ali sua morada e aliou-se a uma inevitável discrição, que muitas vezes tenta esconder uma mulher generosa, determinada e ciosa do que pensa em relação à profissão. “É o que a gente vai fazer aqui nessa terra. A proposta é essa: reduzir as doenças e proteger a saúde das crianças e de suas mães, respeitando a história de vida de cada um dos meus concidadãos”, finaliza.

Bianca Alves

Criadora e editora do projeto AQUI PL, é formada em Comunicação Social pela UFMG e trabalhou em publicações como os jornais O Tempo, Pampulha, O Globo; revistas Isto é, Fato Relevante, Sebrae, Mercado Comum e site Os Novos Inconfidentes

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