O futebol e o jogo da polarização

O futebol e o jogo da polarização

Ronny Rodrigues*

Nunca antes na história do nosso país, a Seleção Brasileira usou uniforme sem as cores da bandeira. A notícia de que isso está prestes a mudar tem provocado discussões acaloradas nas redes sociais. Ao que parece, essa polêmica não vai acabar tão cedo.

Tudo começou após o site Footy Headlines, especializado em vazamentos de materiais esportivos, divulgar que a camisa 2 da seleção vai ser vermelha em vez de azul. Ainda segundo o site, a mudança está prevista para março de 2026, ano de Copa do Mundo.

O problema é que 2026 também é ano de eleições presidenciais no Brasil. Por causa disso, o que deveria se limitar às quatro linhas do gramado passou para o terreno minado da polarização política.

O vermelho, que em muitas culturas representa paixão, coragem e vitalidade, aqui no Brasil, carrega outro peso: é associado, quase automaticamente, ao comunismo, ao Partido dos Trabalhadores e, por extensão, ao Lula. Portanto, era óbvio que haveria reações.

Para os críticos, o governo federal usou de sua influência na escolha da nova cor para fazer propaganda subliminar, a fim de conquistar votos. A teoria da conspiração já ganhou milhares de adeptos.

Propositalmente ou não, essas pessoas ignoram um detalhe: a Nike, responsável pela produção do uniforme, conta com uma competente equipe de Marketing, certamente atenta à divisão ideológica que assola o Brasil.

Considerando-se que, nos últimos anos, a tradicional camisa verde e amarela da nossa seleção foi apropriada pelos simpatizantes da “direita”, o mais provável é que a decisão do time de publicitários da multinacional tenha sido motivada pelo desejo de aumentar o volume de venda das camisas, visando também os simpatizantes da “esquerda”.

Então, nada mais eficiente do que traçar uma estratégia disruptiva capaz de gerar propaganda gratuita. Não por acaso, o assunto está na internet, nos grupos de Whatsapp, nos jornais, nas rádios, nas TVs e nas mesas de bares.

O curioso é que muitos que defendem a teoria da conspiração acham ainda que a CBF é uma espécie de “comitê revolucionário de doutrinação marxista” e não uma entidade privada detentora de um monopólio que rende cifras milionárias, sobretudo em Copas do Mundo.

Nos debates sobre o tema, alguns chegam a alegar que a mudança da cor do uniforme da seleção fere a Constituição Brasileira, numa tentativa de legitimar a indignação e ligar o futebol ao patriotismo, como se berrar “É HEXA!” significasse alguma coisa.

O amor à pátria não tem nada a ver nem com torcida nem com futebol. Não basta pintar o rosto de verde e amarelo a cada quatro anos para depois voltar para casa e esquecer que o Brasil continua com seus problemas, desafios e injustiças.

Ser patriota é lutar todos os dias por um país mais justo; é agir com ética nas grandes e pequenas causas; é respeitar quem pensa diferente; é ensinar os filhos a se preocuparem com o próximo; é se empenhar para formar uma sociedade melhor; é encarar e combater o atraso secular que ainda nos amarra. Enfim, é se importar com o país nos dias sem jogos, quando os noticiários costumam revelar esquemas de corrupção, expor escolas sem merenda, denunciar hospitais sem médicos, mostrar a violência crescente e lamentar vidas tiradas por imprudência ao volante.

Que o uniforme verde, amarelo, azul, branco, vermelho ou multicolor da seleção – ironicamente, ainda sem garantir vaga na Copa – seja apenas um pedaço de tecido. A torcida deve ser para que o verdadeiro patriotismo ganhe de goleada contra a indiferença e esteja estampado no caráter e nas atitudes de cada um de nós.

*Ronny Rodrigues é jornalista há 26 anos e apaixonado pela maltratada Língua Portuguesa. Foi repórter e editor da Rede Globo e TV Alterosa. Também chefiou a Comunicação da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais.

Redação

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